"Bom dia a todos. São 7h30 e estamos entrando neste momento no Canal de Lemaire. A ponte está aberta para aqueles que quiserem acompanhar a entrada, como também as cobertas externas do barco". Fui acordado pela voz de Sebastian no auto-falante do navio, anunciando a entrada no Canal de Lemaire. Sono....muito sono ! Mas enfim, tenho que levantar. Ainda deu tempo de ver uma ou duas baleias nadando na volta do navio antes de descer para o café da manhã. Entramos nas Ilhas Argentinas as 9h00 em ponto e começamos a operação de desembarque logo em seguida. O navio desta vez parou bem na frente da estação ucraniana Vernadsky, dentro do estreito canal que separa as duas ilhas principais.
Logo estavam todos na frente da estação e quando me preparava para entrar, Sebastian chamou a todos convidando para um "passeio privado" do grupo Staff. Aproveitamos que todos os passageiros estavam em boas mãos ucranianas e saimos todos (Sebastian, Sho, Alex, Doc e eu) em um Zodiac pelos canais estreitos até Skua Creck, um pouco mais ao sul. Foi uma surpresa pois encontrei o "Santa Maria Australis" fundeado e escondido no meio de duas ilhotas. Que veleiro maravilhoso ! quero ter um destes.
Um pouco mais adiante deste ponto paramos próximos a uma casinha pequena com a bandeira inglesa e dois carpinteiros. Eles estão reconstruindo uma antiga estação inglesa que servirá de museu, assim como Port Lockeroy. Achei bárbaro. Provavelmente no próximo ano poderemos passar por ali. Os canais são fantásticos para se parar com um veleiro, e as águas do canal profundo está cheio de focas e baleias.
Voltamos para pegar todos os passageiros e fazer um passeio de zodiac pelos canais. Vimos várias focas caranguejeiras descansando por ali, algumas skuas sobre as pedras, e uma infinidade de formas variadas de icebergs. Como a área das Ilhas Argentinas é muito rasa, a maioria dos grandes icebergs que migram de sul para norte acabam parando por ali. É um estacionamento de icebergs. Ficamos por uns 40 minutos entre os blocos de gelo, até voltarmos para o barco, primeiro Sho e eu em zodiacs diferentes. Os outros seguiam bem atrás. Dai aconteceu ! até o momento foi o ponto mais cômico da viagem.
Parei o zodiac como de costume na passarela do navio e desembarquei meus 11 passageiros. Mika, o oficial da ponte me avisou pelo rádio para deixar o zodiac amarrado na popa ao invés de subi-lo com o guincho. Essa manobra é comum para os russos, pois o barco fica amarrado na popa e o piloto tem que "saltar" para dentro do navio, que tem uma diferença de altura de uns 1,80 m entre o Zodiac e a borda. Fácil ! para um russo de 1,90 como a maioria por aqui. Na primeira tentativa, eu simplesmente fiquei pendurado pela borda, e o zodiac se afastou da borda no mesmo instante. Ou seja, fiquei pendurado como um perfeito imbecil enquanto que Yuri, o oficial de convés me olhava meio atônito sem saber o que fazer. Após uma série de impropérios em várias linguas, Yuri entendeu o meu "Take the F. rope again !" e mais alguns palavrões em espanhol e portugues, e puxou a cordo do zodiac novamente. Com isso ganhei pé e pelo menos me livrei do banho de água gelada. Seria no mínimo ridículo ser o único a cair na água em toda a viagem ! Pensei meio rápido e aproveitei uma pequena onda para dar um impulso na borracha do zodiac e pular os 10 centimetros que me faltavam em altura. Pode parecer pouco mas fez uma diferença enorme ! consegui me apoiar com mais firmeza na borda e depois de mais uns impropérios, rolei para dentro do barco. Que situação mais ridícula ! Yuri, primeiro assustado com a possibilidade de me ver dentro d'água, passou ao riso aberto, enquanto que eu ficava entro o "F." e o "S." (em inglês em alto e bom tom!).
Passado o susto, almoço rápido e mais uns 30 minutos de navegação, fundeamos na frente de Peterman Island. O sol abriu firme e forte, requerendo uma camada extra de protetor solar. Descemos as 3 da tarde na ilha e caminhamos dispersamente pela pinguineira de adélies, papuas e alguns cormorões de olho azul. Os filhotes estavam enormes. De repente, no meio de todas as pedras, alguma coisa me chamou a atenção e lá estava um pedaço enorme de um tronco fossilizado. A arvore devia ser bem grande e obviamente, não havia uma floresta ali. Esse pedaço deve ter sido trazido pela geleira da ilha que retrocedeu muito nos últimos milhares de anos. Ainda é possivel ver os diversos terraços dos antigos períodos de deglaciação. Ainda encontrei um pouco mais acima, cerca de uns 25 metros acima do nível do mar, uma paleopraia - um conjunto de pedras roliças, arredondadas pelo mar, provavelmente naquele nível a milhares de anos atrás. Essas são as maiores provas das alterações climáticas de longo curso durante a história geológica da Terra. Ainda nos deliciamos um pouco pela ilha, entre as diversas pinguineiras, e voltamos ao navio já com o vento querendo chegar na casa dos 20 nós, mas ainda com muito sol.
Mais 30 minutos de navegação e entramos em Girard cove, para nos abrigarmos sobre um paredão de rocha e neve, especialmente preparados para o churrasco antártico tradicional. Sol e nada de vento, muita gente jovem a bordo nessa viagem, e o churrasco transcorreu como a comédia tragi-cômica de sempre: bêbados de fim de festa e música russa da pior qualidade. Eu sai depois da segunda garrafa de vinho quebrada rolando pelo convés, já cansado e com muito sono.
Amanhã espero que o tempo continue firme. Iremos a Baía Paraíso, Skontorp e Neko.
Nenhum comentário:
Postar um comentário